domingo, janeiro 29, 2006

 

domingo, dezembro 14, 2003

 
Amor Oculto
Roseana Murray

Na multidão busco meu amor
ainda anônimo
Seu rosto que não conheço
entre tantos rostos,
a voz que acenderá estrelas
e que ainda é uma voz qualquer
busco meu amor oculto
como um segredo entre as folhagens
e meu coração dispara
a cada indício do seu rastro
busco meu amor como
a chave de um castelo
esquecido há milênios
em algum lugar obscuro
do mundo
busco meu amor desconhecido
como quem busca algodão
num campo imenso
para se forrar por dentro.

segunda-feira, novembro 10, 2003

 
Não sei se é vício
ou se é praga,
se é carma,
dogma,
saga.
Não sei de onde
ou de quem.
Só sei que ela vem
e me pega
e rasga e dobra
e me cega
até dominar totalmente.
Quando já estou
inerte e dependente,
vai embora
pra retornar enigma a qualquer hora.
Estigma.

Flora Figueiredo

terça-feira, setembro 30, 2003

 
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer !
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder ...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer !

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda ...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz !

Amo-te tanto ! E nunca te beijei ...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

Florbela Espanca

quinta-feira, agosto 21, 2003

 
O sonho aprendeu a pairar bem alto,
lá onde o sobressalto nem sequer nasceu.
Namorou a trôpega ilusão,
até que, trêfego e desajeitado,
desprendeu-se de seu reino idealizado,
veio pousar tamborilante em minha mão.
Assim, aquecido e aconchegado,
parece que se esqueceu de ir embora.
na hora em que ressona distraído,
eu lhe pingo malemolências ao ouvido,
à sua inquietação eu me sujeito.
Eis que o sonho dorme agora aqui comigo,
seu corpo repousando no meu peito.

[Flora Figueiredo]

 
Ando tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar
Ando tão à flor da pele que teu olhar flor na janela me faz morrer
Ando tão à flor da pele que meu desejo se confunde com a vontade de não ser
Ando tão à flor da pele que a minha pele tem o fogo do juízo final

Ando tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar
Ando tão à flor da pele que teu olhar flor na janela me faz morrer
Ando tão à flor da pele que meu desejo se confunde com a vontade de nem ser
Ando tão à flor da pele que a minha pele tem o fogo do juízo final

Barco sem porto sem rumo, sem vela
Cavalo sem cela
Bicho solto
Um cão sem dono
Um menino
Um bandido
Às vezes me preservo, noutras suicido

[oh sim, eu estou tão cansado
mas não prá dizer que eu não acredito mais em você
eu não preciso de muito dinheiro graças a Deus
mas vou tomar aquele velho navio
aquele velho navio]

Um barco sem porto, sem rumo, sem vela
Cavalo sem sela
Bicho solto, um cão sem dono, um menino, um bandido
às vezes me preservo, noutras suicido

[Zeca Baleiro]

 
Não sei...
se a vida é curta
ou longa demais para nós.
Mas sei que nada do que vivemos
tem sentido,
se não tocarmos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe,
braço que envolve,
palavra que conforta,
silêncio que respeita,
alegria que contagia,
lágrima que corre,
olhar que sacia,
amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo:
é o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
não seja nem curta,
nem longa demais,
mas que seja intensa,
verdadeira e pura...
enquanto durar.

[Cora Coralina]

 
Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha da vida,
sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério.

A quatro mãos escrevemos o roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério.

[Lya Luft]

 
NOSSOS DESEJOS
(Rose Maura Fleixer)

Os desejos nos revelam além de nós
pois expressam a figura da alma
que se esconde por baixo dos lençóis

Vi no espelho o reflexo da escuridão
estampado em meus olhos
na sombra de minha triste decisão

Desejei um desejo de sombra
sobre uma exitência alheia
desdesejo agora essa vontade
para que eu retome da minha vida a teia

No horizonte do meu ser
procuro a mágica da superação
em silêncio e sem alarde
aprendendo a cada lição

Que sempre reste uma fenda
em cada porão que me encontre
para que o sol penetre
e eu me reencontre

quarta-feira, junho 25, 2003

 
ROMANTISMO

QUEM tivesse um amor, nesta noite de lua,
para pensar um belo pensamento
e pousá-lo no vento!

Quem tivesse um amor-longe, certo e impossível-
para se ver chorando e gostar de chorar,
e adormecer de lágrimas e luar!
Quem tivesse um amor,e, entre o mar e as estrelas,
partisse por nuvens, dormente e acordado,
levitando apenas, pelo amor levado...

Quem tivesse um amor, sem dúvida, nem mácula,
sem antes nem depois: verdade e alegoria...
Ah! quem tivesse... ( Mas, quem teve? quem teria?)

Cecília Meireles

sábado, junho 21, 2003

 
Chega mais perto moço bonito
Chega mais perto meu raio de sol
A minha casa é um escuro deserto
Mas com você ela é cheia de sol
Molha tua boca na minha boca
A tua boca é meu doce é meu sal
Mas quem sou eu nesta vida tão louca
Mais um palhaço no teu carnaval
Casa de sombra vida de monge
Quanta cachaça na minha dor
Volta pra casa fica comigo
Vem que eu te espero tremendo de amor

Tom Jobim

quinta-feira, maio 29, 2003

 
Desamor.
É pedir licença pra entrar na prória casa, é ganhar crachá de visitante pra entrar na própria empresa, é não poder tirar os sapatos e nem nem repetir o pudim. É ter que terminar o prato de arroz, ainda que não tenha mais fome, é beber água sem gelo ainda que esteja calor, porque é o que tem e de outra maneira morreríamos de sede. Ou então é morrer de sede mesmo assim.
É um buraco que se abre fundo diante de seus pés, é uma noite que não acorda nunca, mas que também não adormece. É uma tentativa de acertar que sabe-se errada, uma hora desesperada que sabe-se imprópria, uma guerra que sabe-se perdida.
É um tempo que não passa enquanto esperamos um ônibus que não vem. É uma estaca nos nossos pés, que não nos deixa mover, atravessar a rua, pegar um metrô, ou caminhar. É esperar o ônibus, como se ele viesse, achando que aquele ali vermelho e branco pode ser, sabendo-se que não será. É uma esperança teimosa, cega e surda essa coisa de amor. Queria eu, que ela fosse também muda, Mas não é. Porque grita.

Ana

quinta-feira, maio 15, 2003

 
Uma mulher é uma mulher ainda que.
Palavras e formas não comportem o conteúdo.

Uma mulher pode ser um jeito.
Uma costela ou um defeito.
Uma mulher transborda pelos cantos.
Enche medidas.
Contorna o desafino.
Toca punheta e toca sino.

Uma mulher pode ser um grito
Uma barriga
Um precipício.

Uma mulher pode ser um abismo ou um porto.
E pode ser os dois.
E é.

Maria Rezende

quarta-feira, maio 14, 2003

 
Reinvenção

A vida só é possível
reinventada

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! Tudo bolhas
que vêm de fundas piscinas
de ilusionismo... mais nada

Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada

Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços
Projeto-me por espaços
cheios da tua figura
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura

Não te encontro, não te alcanço...
Só, no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva
Só, na treva,
fico: recebida e dada

Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada

Cecília Meireles

 
Ser mulher...

Nasci mulher, é fato
Gameta indiscutível,
Cometa irremediável,
Soneto jamais escrito.

Cresci menina, concordo,
De pernas cruzadas,
Cabelos alinhados,
Pelos depilados.

Vivi madura, é certo.
Aprendi a traçar os olhos,
A disfarçar as lágrimas,
A não borrar a maquiagem.

Sonhei criança, feliz.
Escrevi meus passos,
Acreditei nos planos,
Colhi meus frutos.

Provoquei emoções, faz parte.
Ensinei meus truques,
Repiquei batuques,
Batalhei com arte.

Briguei na vida, gritei.
Enfoquei os problemas,
Resolvi os teoremas,
Me entreguei a poemas.

Quebrei espelhos, de raiva.
Escondi a dor,
Distribuí amor,
Superei o tempo.

Amei demais, está em mim.
Mulher sem amor não existe.
Atraí desejos, por capricho,
Ou não, por pura paixão.

Caminhei e caí, me ergui.
E não pretendo mudar.
Arregacei as mangas tantas vezes,
Que já nem sei desenrolar.

Mas...quer saber?
É uma delícia ser mulher!
Não troco por nada, por ninguém.
Volto assim mil vezes, se puder.

E quando o véu da noite,
De inveja e despeito me levar,
Que o amor que distribuí,
Os frutos que plantei, venham, enfim, me regar.

Lílian Maial

sexta-feira, abril 25, 2003

 
Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...


Mário Quintana

terça-feira, abril 08, 2003

 
Te abracei
Sem nunca te tocar

Te almejei
Sem nunca te alcançar

Te perdi
Sem nunca te largar

Te possuí
Sem nunca te abraçar
Amor, meu grande amor,
Como conseguiste partir
Se nunca estiveste por chegar?
Volta, para que eu possa me achar.
Me acha, para que eu possa te encontrar.
Depois dorme, para que eu possa sonhar.
E sonha, para que eu possa acordar.

E não deixa de falar
Para que eu possa cantar.
E canta, para que eu possa me encantar
E no meu encanto eu possa me calar.

E, mais que tudo, meu amor, me beije forte
Para que o teu corpo me sufoque,
E no sufoco do meu corpo
Minha alma possa respirar.

Kali - Blog Kálido

quarta-feira, fevereiro 05, 2003

 
Há tanto tempo venho procurando
Tempo venho te chamando
Você existe eu sei
Em algum lugar do mundo você vive
Vive como eu
Onde eu ainda não fui
Como é o seu rosto
Qual é o gosto que eu nunca senti
Qual é o seu telefone
Qual é o nome que eu nunca chamei
Esbarrei na rua com você
E não te vi meu amor
Como poderia saber
Tanta gente que eu conheci
Não me encontrei só me perdi
Amo o que eu não sei de você
Como é o seu rosto
Qual é o gosto que eu nunca senti
Qual é o seu telefone
Qual é o nome que eu nunca chamei
Sei que você pode estar me ouvindo
Ou pode até estar dormindo
Do acaso, eu não sei
Talvez veja o futuro em seus olhos
Pelo seu jeito de me olhar,
Vou me reconhecer em você

Biquini Cavadão

segunda-feira, fevereiro 03, 2003

 

sexta-feira, janeiro 31, 2003

 
Meu corpo teu ninho

A simples lembrança dos teus dedos na minha nuca me arrepiam
Teu cheiro me habita a alma e meu peito, arfante, te recebe.
Me abraça, vem dormir comigo
Me ajuda a apagar do peito aquela dor do querer.
A noite se instala em mim.
Lá fora, apenas o silêncio da noite do teu olhar.

Vem.
Ocupa com teu corpo esse abrigo que te chama.
Volta a ser minha morada, teu abrigo
Faz de mim tua caverna, teu porto seguro.
Faz do meu corpo teu ninho.

Atordoada pelas saudades crescentes,
meu corpo todo se ouriça à tua procura.

Léa Waider

sexta-feira, janeiro 10, 2003

 
tem palavra
que não é de dizer
nem por bem
nem por mal
tem palavra
que não é de comer
que não dá pra viver
com ela
tem palavra
que não se conta
nem prum animal
tem palavra
louca pra ser dita
feia bonita
e não se fala
tem palavra
pra quem não cala
pra quem tem palavra
tem palavra
que a gente tem
e na hora H
falta

Alice Ruiz

 
Sim, todos... todos os poemas do mundo para dizer em lindos versos o que eu penso, sinto, preciso...

 
Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua de estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.
Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.
Que este amor só me veja de partida.

Hilda Hilst

 
quando eu vi você
tive uma idéia brilhante
foi como seu eu olhasse
de dentro de um diamante
e meu olho ganhasse
mil face num só instante

basta um instante
e você tem amor bastante

Paulo Leminski

 
quando chove,
eu chovo,
faz sol,
eu faço,
de noite,
anoiteço,
tem deus,
eu rezo,
não tem,
esqueço,
chove de novo,
de novo, chovo,
assobio no vento,
daqui me vejo,
lá vou eu,
gesto no movimento

Paulo Leminski

segunda-feira, janeiro 06, 2003

 
"Eu sei do que preciso.
Avisto, ao longe, o caminho certo.
Não peço a Deus, que me faça feliz.
Peço sim, com força, que Deus me faça valente.
Não é necessário que me trace um caminho bonito. Eu sei que o caminho está lá.
É necessário, que nos meus pés haja força pra alcançá-lo.
Não Deus, não carece de plantas, ou de beleza, a vida. Mas eu preciso de olhos mais fortes pra olhar.
E que tudo o que está continue. É o que peço. Que o mundo mantenha-se belo.
Só o que não deve manter-se, eu suplico, é a gente. Toda a gente, trancada na sua paralisia suicida.
Meus músculos, Deus, faça-os fortes. As vértebras, os ligamentos, ordene que se movam pra frente.
O caminho está ali, vasto. Porque não o sigo?
Que força é essa que impede meu pescoço de torce-se para olhar?
Se posso andar, Deus, faça com que eu caminhe…
Destranque, por fim, minhas amarras, meus laços, meus lenços,
todos os tampões que me fazem surdo.
Todas as mordaças que me fazem mudo."

 
"E se alguém me amasse?
Se alguém, de repente, chegasse
E, vendo-me, reconhecesse
A chuva, a terra e o sal que buscasse?

Entre o temor e o sobressalto,
Talvez fugisse,
Talvez risse, talvez cantasse,
Na incerteza e no medo
De entregar-se."

Maria José de Queiroz

 
QUANDO EU SONHAVA

Quando eu sonhava, era assim
Que nos meus sonhos a via;
E era assim que me fugia,
Apenas eu despertava,
Essa imagem fugidia
Que nunca pude alcançar.

Agora, que estou desperto,
Agora a vejo fixar...
Para quê?- Quando era vaga,
Uma ideia, um pensamento,
Um raio de estrela incerto,
No imenso firmamento,
Uma quimera, um vão sonho,
Eu sonhava - mas vivia:
Prazer não sabia o que era,
Mas dor, não na conhecia...

Almeida Garrett

 
TEMPLO DO UNIVERSO

Do meu olhar te converteste em templo,
Te tornando tão enorme com o tempo
Que, só meus olhos,
Já não podem contemplar...

Percorro, então, teu universo,
Explorando mundos,
Descobrindo galáxias,
Me perdendo em nebulosas...
No teu cosmo explodem super-novas -
Novas estrelas
No teu céu a pesquisar...

A cada dia um novo sonho,
Um segredo,
Uma revelação...
E por mais que eu pense em fugir,
Nada mais em ti buscar,
O infinito ressurge:
Só a eternidade
Para poder te desvendar.

Marco Aurélio M. Ferreira

 
E alegre se fez triste

Aquela clara madrugada que
viu lágrimas correrem no teu rosto
e alegre se fez triste como se
chovesse de repente em pleno Agosto.

Ela só viu meus dedos nos teus dedos
meu nome no teu nome. E demorados
viu nossos olhos juntos nos segredos
que em silêncio dissemos separados.

A clara madrugada em que parti.
Só ela viu teu rosto olhando a estrada
por onde um automóvel se afastava.

E viu que a pátria estava toda em ti.
E ouviu dizer-me adeus: essa palavra
que fez tão triste a clara madrugada.

Manuel Alegre

 
Intimidade

Que ninguém hoje me diga nada.
Que ninguém venha abrir a minha mágoa,
esta dor sem nome
que eu desconheço donde vem
e o que me diz.
É mágoa.
Talvez seja um começo de amor.
Talvez, de novo, a dor e a euforia de ter vindo ao mundo.

Pode ser tudo isso, ou nada disso.
Mas não afirmo.
As palavras viriam revelar-me tudo.
E eu prefiro esta angústia de não saber de quê.

Fernando Namora

 
Realidade

Em ti o meu olhar fez-se alvorada
E a minha voz fez-se gorjeio de ninho...
E a minha rubra boca apaixonada
Teve a frescura pálida do linho...

Embriagou-me o teu beijo como um vinho
Fulvo de Espanha, em taça cinzelada...
E a minha cabeleira desatada
Pôs a teus pés a sombra de um caminho...

Minhas pálpebras são cor de verbena,
Eu tenho os olhos garços, sou morena,
E para te encontrar foi que eu nasci...

Tens sido vida fora o meu desejo
E agora, que te falo, que te vejo,
Não sei se te encontrei... se te perdi...

Florbela Espanca

segunda-feira, dezembro 16, 2002

 
Eu não peço desculpa e nem peço perdão
Não, não é minha culpa essa minha obsessão
Já não aguento mais ver o meu coração
Como um vermelho balão rolando e sangrando, chutado pelo chão
Psicótico, neurótico, todo errado
Só porque eu quero alguém que fique 24 horas do meu lado
No meu coração, eternamente colado.

Caetano Veloso & Jorge Mautner

 
Tudo de amor que existe em mim foi dado.
Tudo que fala em mim de amor foi dito.
Do nada em mim o amor fez o infinito
Que por muito tornou-me escravizado.

Tão pródigo de amor fiquei coitado
Tão fácil para amar fiquei proscrito.
Cada voto que fiz ergueu-se em grito
Contra o meu próprio dar demasiado.

Tenho dado de amor mais que coubesse
Nesse meu pobre coração humano
Desse eterno amor meu antes não desse.

Pois se por tanto dar me fiz engano
Melhor fora que desse e recebesse
Para viver da vida o amor sem dano.

Paulo Mendes Campos / Vinícius de Moraes

domingo, dezembro 08, 2002

 
É Hoje - União da Ilha (1982)

A minha alegria atravessou o mar
E ancorou na passarela
Fez um desembarque fascinante
No maior show da Terra

Será que eu serei o dono desta festa
Um rei
No meio de uma gente tão modesta
Eu vim descendo a serra
Cheio de euforia para desfilar
O mundo inteiro espera
Hoje é dia do riso chorar

Levei o meu samba
Pra mãe-de-santo rezar
Contra o mau olhado
Carrego o meu Patuá

Acredito ser o mais valente
Nesta luta do rochedo com o mar
(E com o mar)

É hoje o dia da alegria e a tristeza
Nem pode pensar em chegar

Diga espelho meu
Se há na avenida
Alguém mais feliz que eu

quarta-feira, dezembro 04, 2002

 
O Amor Antigo

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.

Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
o antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.

Mais ardente, mas pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.

Carlos Drummond de Andrade

domingo, dezembro 01, 2002

 
Amor é Síntese

Por favor não me analise
Não fique procurando cada ponto fraco meu
Se ninguém resiste a uma análise profunda
Quanto mais eu
Ciumento, exigente, inseguro, carente
Todo cheio de marcas que a vida deixou
Vejo em cada grito de exigência
Um pedido de carência, um pedido de amor
Amor é síntese
É uma integração de dados
Não há que tirar nem pôr
Não me corte em fatias
Ninguém consegue abraçar um pedaço
Me envolva todo em seus braços
E eu serei perfeito amor.

Mário Quintana

segunda-feira, novembro 11, 2002

 
Tenho lido tantas poesias ultimamente. E é incrível como sempre encontro um poema para expressar meus momentos. Gostaria eu, saber escrever em versos as coisas que sinto. Ainda que fossem versos soltos, rimas pobres... mas não é para mim. Há quem os faça ou fez por mim. Este é para minha madrugada solitária...

Quando estou só reconheço

Quando estou só reconheço
Se por momentos me esqueço
Que existo entre outros que são
Como eu sós, salvo que estão
Alheados desde o começo.
E se sinto quanto estou
Verdadeiramente só,
Sinto-me livre mas triste.
Vou livre para onde vou,
Mas onde vou nada existe.
Creio contudo que a vida
Devidamente entendida
É toda assim, toda assim.
Por isso passo por mim
Como por cousa esquecida.

Fernando Pessoa

 
Saudade

Saudade é solidão acompanhada, é quando o amor ainda não
foi embora, mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou, é recusar um presente que nos machuca, é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam, é a dor dos que ficaram para trás, é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos: não ter por quem sentir saudades, passar pela vida e não viver. O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

Pablo Neruda

quinta-feira, novembro 07, 2002

 
Olhar acarinhando
Seduzindo
Um sorriso gostando
Entregando

Gesto insinuando
Tirando
Uma língua provando
Degustando

Palavras molhando
Delirando
Duas bocas fazendo
Enlouquecendo
Corpo deitando
Oferecendo
Minhas pernas abrindo
Convidando

Lábios chamando
Querendo
Minhas mãos empurrando
Trazendo

Eu gemendo
Sofrendo
Chorando
Morrendo

Sonhar como se você me faz
pesadelo ?

Fernando Pessoa

terça-feira, novembro 05, 2002

 

Todo Sentimento

Preciso não dormir até se consumar o tempo da gente
Preciso conduzir um tempo de te amar
Te amando devagar e urgentemente
Pretendo descobrir no último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo sentimento, e bota no corpo uma outra vez
Prometo te querer, até o amor cair doente
Doente
Prefiro então partir a tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder, te encontro com certeza
Talvez no tempo da delicadeza
Onde não diremos nada, nada aconteceu
Apenas seguirei como encantado ao lado teu

Cristovão Bastos e Chico Buarque

sábado, outubro 26, 2002

 
:: Memória ::
Amar o perdido
Deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.

Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
(Carlos Drummond de Andrade)

 
:: Cardíaca ::

Nasce do coração
O sangue envenenado
Asfixiado
Negro
O sangue-pânico
O sangue que arde nas veias

Das artérias
Brota o sangue úmido
Vermelho-saudade
Esperança em carne viva
Brota e volta e
Vai e vem
O amor que espera
Transborda
Alimenta
E não finda.

O coração que chora
Deseja.
O coração que ama
Espera.
Ainda
Sempre.

Fabiana Lopes

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